21 Junho 2018
“O ser humano enfrenta esta encruzilhada: Deus me impõe as coisas ou cuida de mim? Os seus mandamentos são somente uma lei ou contêm uma palavra para me cuidar? Deus é um patrão ou um pai? Somos súditos ou filhos?” Estas são as perguntas retóricas que o Papa Francisco dirigiu aos fiéis que participaram da Audiência Geral de hoje, 20 de junho de 2018, na Praça São Pedro.
A reportagem é de Iacopo Scaramuzzi, publicada por Vatican Insider, 20-06-2018. A tradução é de André Langer.
O Papa deu continuidade ao seu ciclo de catequese dedicado aos “Dez Mandamentos”, ressaltando que no original hebraico não se fala realmente de “mandamentos”, mas de “palavras”, termo que lembra um “diálogo” entre pai e filhos, razão pela qual “o mundo não precisa de legalismos, mas cuidados, precisa de cristãos com coração de filhos”.
Na Bíblia, disse Jorge Mario Bergoglio, “os mandamentos não vivem por si mesmos, mas fazem parte de uma relação, a da Aliança entre Deus e seu Povo. No início do capítulo 20 do livro do Êxodo, lemos: ‘Deus pronunciou todas essas palavras’. Parece um começo como muitos outros, mas nada na Bíblia é banal. O texto não diz: ‘Deus pronunciou estes mandamentos’, mas ‘estas palavras’. A tradição hebraica sempre chama o Decálogo ‘as dez Palavras’. E o termo ‘decálogo’ significa precisamente isso. No entanto, têm a forma de leis, são objetivamente mandamentos”. Por que, então, a Bíblia “usa, justamente aqui, o termo ‘dez palavras’ e não diz ‘dez mandamentos’? Qual é a diferença entre um mandamento e uma palavra? O mandamento – explicou Francisco – é uma comunicação que não requer diálogo. A palavra, ao contrário, é o meio essencial da relação como diálogo”.
De fato, “duas pessoas que não se amam não conseguem se comunicar. Quando alguém fala ao nosso coração, nossa solidão acaba”. Nesse sentido, “os mandamentos são palavras de Deus, Deus comunica nessas dez palavras e aguarda a nossa resposta”.
O Papa deu o exemplo do relato bíblico de Adão e Eva: “o Tentador, o diabo quer enganar o homem e a mulher neste ponto: quer convencê-los de que Deus os proibiu de comer o fruto da árvore do bem e do mal para mantê-los subjugados. O desafio é precisamente este: a primeira norma que Deus deu ao homem é a imposição de um déspota que proíbe e obriga, ou é o cuidado de um pai que está cuidando dos seus pequenos e os protege da autodestruição? É uma palavra ou uma ordem? A mais trágica entre as mentiras que a serpente diz a Eva, é sugerir uma divindade invejosa, Deus tem inveja de você, é possessivo, Deus não quer que tenham liberdade”.
“Os fatos mostram dramaticamente que a serpente mentiu – continuou Francisco. Ela fez acreditar que uma palavra de amor era uma ordem. O homem está diante desta encruzilhada: Deus me impõe as coisas ou cuida de mim? Seus mandamentos são uma lei ou contêm uma palavra para cuidar de mim? Deus é um patrão ou um Pai? O que vocês acham?”, insistiu Francisco dirigindo-se aos fiéis, que responderam a uma só voz: “Pai!” “Deus é pai – continuou Francisco –, e nunca se esqueçam disso. Mesmo nas situações mais difíceis, pensam que tem um pai que ama a todos? Somos súditos ou filhos?” “Filhos!”, respondeu a multidão de fiéis que estava presente na audiência. “Essa luta, dentro e fora de nós, é constantemente apresentada: milhares de vezes temos que escolher entre uma mentalidade de escravos e uma mentalidade de filhos. A ordem é do patrão, a palavra é do pai”.
“Um espírito de escravos não pode aceitar a Lei opressivamente, e pode produzir dois resultados opostos: ou uma vida feita de deveres e obrigações, ou uma reação violenta de rejeições”, disse o Papa. “Todo o cristianismo – enfatizou – é a passagem da letra da Lei para o Espírito que dá a vida. Jesus é a Palavra do Pai, não é a condenação do pai. Jesus veio para salvar com sua palavra, não para nos condenar. É possível ver se um homem ou uma mulher viveram esta passagem ou não. As pessoas – insistiu o Papa – percebem se um cristão raciocina como filho ou como escravo. E nós mesmos nos lembramos se nossos educadores cuidaram de nós como pais e mães ou se impuseram apenas regras sobre nós. Os mandamentos são o caminho para a liberdade, porque são a Palavra do Pai que nos torna livres neste caminho. Queridos irmãos e irmãs – concluiu o Pontífice argentino –, o mundo não precisa de legalismos, mas de cuidado. Tem necessidade de cristãos com o coração de filhos”.
Antes da Audiência Geral, o Papa reuniu-se na Sala Paulo VI com diferentes grupos de doentes e, em particular, enfermos com esclerose lateral amiotrófica, por ocasião da Jornada Mundial que será celebra amanhã, 21 de junho.
No final da audiência, o Rony Roller Circus fez uma breve apresentação para o Papa: “Eles nos fizeram ver que a beleza faz bem à alma e ao corpo – disse Francisco –, e essa beleza que eles nos mostraram não é uma beleza que se encontra assim, é uma beleza que eles produzem com tanto trabalho, horas e horas de treinamento, mas no final conseguiram fazer isto que, como toda beleza, nos aproxima de Deus: muito obrigado!”
Para os peregrinos de língua alemã, o Papa pediu orações pela viagem, “peregrinação ecumênica”, a Genebra, cidade que visitará amanhã para o 70º aniversário do Concílio Ecumênico das Igrejas.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Francisco. Deus não é um patrão, mas pai; nós não somos súditos, mas filhos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU